A Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte pagou aos deputados estaduais R$ 900.289,28 em verba de ressarcimento para combustível, entre janeiro e novembro de 2017. O valor seria suficiente para comprar 218,5 mil litros de gasolina comum ou rodar 1,9 milhão de quilômetros – o que corresponde a 48 voltas em torno da Terra ou duas viagens de ida e volta à Lua.
Cada deputado estadual gastou uma média de R$ 3.410,18, ou cerca de 813,8 litros de gasolina por mês. Considerando consumo médio de 9 quilômetros por litro, eles rodaram 7.324,2 quilômetros mensalmente, ou 244,14 quilômetros diários, de domingo a domingo.
Um dos casos que mais chama atenção é o deputado Dison Lisboa (PSD), líder do governo na Assembleia Legislativa. Desde o início de julho do ano passado, o deputado só pode dormir fora de Natal com autorização judicial, por cumprir de prisão no sistema semiaberto, com uso de tornozeleira eletrônica. O juiz de Execuções Penais, Henrique Baltazar, explicou que o deputado pode sair de Natal desde que volte para dormir na comarca onde cumpre pena.
Mesmo diante de restrições, o deputado manteve o padrão de ressarcimento mensal com combustíveis. Em julho, recebeu R$ 4.473,34. No mês posterior, foram R$ 4.574,54 e seguiu assim até novembro, quando gastou R$ 4.486,45. A soma dos gastos, ao longo do período, chegam a R$ 49.078,07.
Ele ficou em terceiro lugar entre os deputados que mais receberam verba recisória para pagamento de combustível. Seguindo a média estabelecida para o cálculo, o deputado teria rodado 316,9 quilômetros diariamente, durante os 31 dias de agosto.
Para fazer esse cálculo, o G1 levou em conta o preço de R$ 4,19 para o litro de gasolina comum. Esse foi o valor mais caro encontrado pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) no estado, durante o levantamento feito para o relatório mensal de preços de novembro do ano passado.
Também considerado o consumo médio de carros utilitários esportivos grande e picapes. Os utilitários mais econômicos chegam a rodar mais de 15 km com um litro. Entre as picapes, as que consomem menos fazem 11 km por litro, de acordo com levantamento do Auto Esporte, feito em julho do ano passado.
Apesar do aumento da gasolina ao longo do período, os maiores gastos foram registrados no primeiro mês do ano, em janeiro, quando os parlamentares estavam de férias. Até o fechamento desta reportagem, os dados de dezembro ainda não tinham sido lançados no portal.
Por ano, cada deputado estadual potiguar pode gastar até R$ 54 mil com combustível. Por mês, além do seu salário, cada deputado recebe até R$ 32 mil como verba de ressarcimento, para gasolina, aluguel de veículo, contratação de consultorias, entre outros gastos do gabinete.
O maior gasto aconteceu no mês de janeiro, quando os parlamentares estavam de férias. As atividades em plenário só voltaram no dia 2 de fevereiro do ano passado. Em julho, os parlamentares tiveram mais 15 dias de recesso.
O cálculo
Confira abaixo como foi feito o cálculo do consumo dos parlamentares.
Valor das notas fiscais / R$ 4,19 (preço do litro em novembro, segundo a ANP) = quantidade de litros de gasolina comum comprados.
Exemplo: R$ 4.500/R$ 4,19 = 1073,98 litros
Quantidade de litros de gasolina comum x 9 km/l (média estipulada para consumo dos carros) = Quantidade de quilômetros rodados no mês.
Exemplo: 1.073,98 litros x 9 km/litros = 9.665,82 quilômetros rodados
Quantidade de quilômetros rodados por mês / 30 (dias) = média de quilômetros rodados por dia.
Exemplo: 9.665,82 km rodados/ 30 dias = 322,194 km/dia
Quem mais gastou
O parlamentar que mais teve ressarcimento da Assembleia Legislativa foi o deputado Tomba Farias (PSB). Em 11 meses, ele consumiu R$ 49.512,02 – uma média de R$ 4.501,09 a cada 30 dias.
Seguindo a mesma lógica do cálculo, Tomba consumiu uma média de 1.074,2 litros de gasolina por mês e rodou 322,2 quilômetros diariamente, de domingo a domingo. Os gastos do deputado se dividiram entre dois postos – um em Natal e outro em Santa Cruz, na região do Trairi, onde o parlamentar tem suas bases. O município fica distante 134 quilômetros de Natal, segundo o IBGE.
Ele foi seguido, em gastos, pelo deputado Fernando Mineiro (PT), que consumiu R$ 49.087,13, ou uma média de R$ 4.462 por mês. Foram gastos, portanto, 1.064,9 litros, que representariam a circulação de 319 quilômetros diários nos 30 dias de cada mês.
Ranking dos deputados que mais gastaram com combustível entre janeiro e novembro de 2017
Deputado (partido) | Valor ressarcido |
Tomba Faria (PSB) | R$ 49.512,02 |
Fernando Mineiro (PT) | R$ 49.087,13 |
Dison Lisboa (PSD) | R$ 49.078,07 |
Ezequiel Ferreira (PSDB) | R$ 49.064,72 |
Vivaldo Costa (Pros) | R$ 47.390,80 |
José Adécio (DEM) | R$ 47.252,41 |
George Soares (PR | R$ 46.924,52 |
Raimundo Fernandes (PSDB) | R$ 46.362,80 |
Larissa Rosado (PSB) | R$ 46.261,50 |
Cristiane Dantas (PCdoB) | R$ 45.394,84 |
Os parlamentares que menos receberam ressarcimento pela compra de combustível são Galeno Torquato (PSD) e Márcia Maia (PSDB). O primeiro, entretanto, apresentou notas fiscais apenas nos meses de janeiro, outubro e novembro. Na soma, gastou R$ 13.248,37.
Márcia Maia apresentou gasto todos os meses, porém com custo mais baixo. Em agosto, quando mais consumiu gasolina, recebeu R$ 1.637,32. Neste mês, a média foi de 117 quilômetros rodados por dia. Ao todo, nos onze meses, ela recebeu ressarcimento de R$ 14.367,26.
Postos exclusivos e distantes
Outro caso curioso o é do deputado Souza Neto (PHS), que tem bases na região Oeste potiguar. Ao longo dos 11 meses do ano, todo o abastecimento de combustível parlamentar foi feito por um único posto localizado no município de Areia Branca, distante 330 quilômetros da capital potiguar, segundo o IBGE.
O parlamentar apresentou notas únicas, mensais, do Posto Costa Branca Eireli. O G1 ligou para o telefone que aparece nos sites de busca por CNPJ (cadastro de pessoa jurídica) e recebeu a confirmação, ao questionar a localização da empresa. “Aqui é Areia Branca, Rio Grande do Norte”, informou o funcionário.
Abastecer em apenas um posto de combustível também é costume de outros parlamentares. O deputado Vivaldo Costa (Pros), só apresentou notas do Posto Sabugi LTDA, localizado em Caicó, na região Seridó potiguar. Ao longo dos 11 meses, foram pagos R$47.390,80.
Já o presidente da Assembleia Legislativa, deputado Ezequiel Ferreira de Souza (PSDB), comprou R$49.064,72 à mesma fonte, ao longo do período: o Posto Ramalho, com razão social Francisco de Sales Dantas, em Macaíba.
Kelps Lima (SDD) abasteceu o ano inteiro no posto Transportes e Comércio Novo Horizonte LTDA, localizado na Zona Sul da capital potiguar. Márcia Maia, já citada, abasteceu apenas no posto Luiz Flor e Filhos LTDA. No mesmo posto, Hermano Morais (PSDB) abasteceu R$ 44.760,09.
O que dizem os deputados
Dison Lisboa declarou que o valor gasto com combustível corresponde ao cumprimento de agenda dele e de sua equipe nas cidades potiguares, “onde, dentro das atribuições conferidas a um mandato parlamentar popular e municipalista, vamos ao encontro da população, participando de eventos, reuniões, e discussões importantes para o Estado. Fato que pode ser verificado em nossas redes sociais, onde recorrentemente são expostas nossas visitas a diferentes município”, declarou.
O deputado também negou que seja proibido de deixar a capital. Segundo a Vara de Execuções Penais, o deputado pode deixar a cidade, desde que volte ao local de cumprimento da pena até a noite.
A assessoria do deputado Fernando Mineiro informou que o combustível não é usado apenas no carro do parlamentar, mas também pela assessoria, quando em trabalho designado pelo mandato. Segundo a assessoria, as devidas prestações de contas através de notas fiscais estão “disponíveis, inclusive, mensalmente” no site do deputado.
Dentre os deslocamentos destacados pela assessoria está a caravana da Transposição do São Francisco, quando o parlamentar e sua equipe de assessores percorreram quatro estado do Nordeste. A assessoria ressaltou que o deputado e assessores viajam constantemente ao interior do estado para ações do mandato.
Souza Neto disse que utiliza o recurso para deslocamento nos trajetos: Areia Branca a Natal para participação das sessões legislativas que ocorrem de terça a quinta. “Nos outros dias, quais sejam: sexta a segunda para finalidade de visitas as bases eleitorais dos municipios de atuação do mandato, compreendendo as regiões: salineira, Oeste, Alto Oeste, Vale do Açu e Mato Grande”, pontuou.
O deputado ainda apontou que o posto que presta serviço de abastecimento fica na sua principal base de sustentação política que é o municipio de Areia Branca “de onde irradia toda a sua atuação politica. Acrescente-se que lá existem dois postos de combustíveis e esta empresa foi quem ofertou melhor proposta”.
O deputado Kelps Lima (SDD), afirmou que o recurso é utilizado para abastecimento dos veículos que servem ao gabinete e são previamente cadastrados na Assembleia. O deputado não informou o número de carros do gabinete. Ainda de acordo com o parlamentar, o posto escolhido para vender o combustível cumpre as exigências de logística e preço de mercado.
“O valor é compatível com a atuação de um mandato parlamentar que tem abrangência em 167 municípios do Rio Grande do Norte. Em 2017, viajamos a cerca de uma centena deles e partir do que vimos nas cidades, produzimos mais de 400 requerimentos pedindo soluções desses problemas ao Governo. Só pedimos o ressarcimento dos abastecimento realizados em Natal”, afirmou.
A assessoria de Larissa Rosado (PSB) informou que os valores correspondem ao combustível gasto com deslocamento dela e de assessores para atividades parlamentares, na capital e interior, inclusive para levar o mandato a várias cidades do Estado, sempre obedecendo à norma que rege a verba indenizatória”.
O parlamentar George Soares (PR) afirmou que visita quase que diariamente “nós ou nossos assessores, os municípios e regiões que buscam seu apoio parlamentar. “Para tanto estruturamos um gabinete na capital e outro de apoio no interior, localizado em Assú, através dos quais encetamos as muitas ações políticas e técnicas necessárias ao bom exercício parlamentar”, disse. Além disso, o deputado ressaltou que dedica, “quase que religiosamente e na íntegra”, todos os finais de semana e feriados para visitas pontuais em todo o estado.
Por fim, o deputado também declarou que dispõe de dados quantitativos e qualitativo relativos à todas as ações desse nível realizadas em 2017, “visto que nos preocupamos também com um criterioso controle dos gastos financeiros de nosso mandato”. Declarou por fim que não poderia disponibilizar os dados nesta terça-feira (30) em virtude do fechamento da Assembleia Legislativa, cercada de manifestantes.
Galeno Torquato (PSD) afirmou que o combustível é utilizado pelo mandato para realizar seu translado para o cumprimento de agendas político-parlamentares em todo o Rio Grande do Norte, sobretudo, na região do Alto Oeste, onde o parlamentar possui residência. “Prezando pela economicidade do dinheiro público, nos meses onde a rubrica dos combustíveis não fez parte da prestação de contas do mandato, o deputado Galeno Torquato custeou tais despesas com recursos próprios, optando por fazer uso das verbas indenizatórias apenas em épocas onde a demanda por viagens se apresentou mais patente”, informou.
O G1 procurou as assessorias dos deputados estaduais e ainda aguarda respotas dos demais. A reportagem não conseguiu contato das assessorias dos deputados Getúlio Rego (DEM) e José Dias (PSDB).
*G1 RN
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